domingo, 26 de novembro de 2017

UMA ESCURIDÃO NO FIM DO TÚNEL

Eduardo Simões

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https://www.newscientist.com/

__ “Eu que não me sento no trono de um apartamento, com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”, assim canta Raul Seixas no seu imortal “Ouro de tolo”, fazendo uma ácida crítica do conformismo e da apatia da classe média brasileira dos anos 70, diante dos sinais graves de desrespeito aos direitos humanos, da censura, da fragilidade de propalado “Milagre Brasileiro”, da burrificação e brutalização de nossa sociedade.
__ Hoje, quando começávamos a antever uma luz no fim do túnel com os progressos alcançados pela atual equipe econômica, e a classe média, enfastiada das ruas, e principalmente dos nobres ideias de limpeza ética e justiça, que levaram multidões a pedir o fim de um governo corrupto, já conformados com a corrupção, agora descarada, de toda a classe política, muitos, como que dando continuidade à mentalidade vigente durante o regime militar, escancaram os seus dentes para o lixo vindo não mais da TV, mas das redes sociais, como pudemos perceber nas hostilidades sofridas por jornalistas da Rede Globo e da TV Brasil esta semana.
__ Os dois episódios parecem guardar relação com a declaração infeliz de William Waack, cujos desdobramentos parecem indicar algo muito mais grave do que imaginam aqueles que reduzem a crise nacional apenas aos cifrões que caprichosamente mudam de bolso, a cada crise política que se segue ao aparecimento de uma verdade sobre os nossos políticos ou sobre a nossa burguesia clientelista. Um comentário irônico a uma fala claramente exagerada e vitimista (veja-se abaixo) de uma das mais badaladas atrizes da TV, Taís Araújo – uma atriz fraca, falta-lhe o carisma e a intensidade espontânea de Camila Pitanga, Zezé Mota, Luiza Maranhão, por exemplo – supondo que as pessoas, no futuro, mudarão de calçada para não falar com o seu filho. Assim, caro leitor, você já sabe: pelo bem das relações interraciais no Brasil, quando estiver na mesma calçada que o filho de Taís Araújo, não saia dela, seja porque razão for, ou você poderá ser acusado de racismo e até ser processado por um certo FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), uma excrescência de governos passados, criado para impor uma censura aos meios de comunicação que não fecharem com a “esquerda” e com o que se convencionou ser politicamente correto, e que no momento intenta processar um diretores da TV Brasil, por não concordar com o comentário de Taís, acusando-o de racismo.
__ Arma-se, portanto, o palco de uma grande intervenção pública, “popular” no Brasil, contra qualquer pessoa cuja manifestação seja considerada, hoje, racista, mas só Deus sabe o que servirá de pretexto, amanhã, para atirar massas ignaras, movidas pelas redes sociais, contra pessoas, empresas ou instituições que sejam obstáculos a determinados projetos, porque nós sabemos, e a história nos informa isso a sobejo, que por trás desses movimentos “populares”, supostamente “espontâneos”, existem direções muito bem articuladas e nada espontâneas, tirando partido do imediatismo de reações apaixonadas, e é isso que as torna tão perigosas.
__ Assim foi na Revolução Francesa, que foi, apesar de seu caráter burguês, embora não-liberal, um banho de sangue desnecessário, que arrastou a Europa para 16 anos de guerras, tão sangrentas quanto evitáveis; assim foi na Revolução Russa, outro banho de sangue, que redundou numa das mais sanguinárias ditaduras, e na derrocada política e econômica de um império colossal e milenar – os brasileiros, não sei porque razão, adoram essas revoluções. O povo também estava nas ruas, hurrando, fanatizado, quando das ditaduras de Mussolini e Hitler. Etc. etc. etc.
__ Recentemente nós vivemos uma ditadura militar, e por causa de medidas tomadas publicamente por sua elite, vimos intelectuais respeitados, principalmente na área da educação, como Paulo Freire, Darcy Ribeiro, Lauro de Oliveira Lima, Anísio Teixeira, etc. serem expulsos, obrigados a fugir, aposentados compulsoriamente, isolados, perseguidos e mortos. Hoje, porém, não é um comando, uma troica, claramente identificada, quem determina o destino desse ou daquele que, por alguma razão, explícita ou não, mexe nos interesses daqueles que por baixo dos panos controlam os marionetes das redes sociais, mas antes homens e mulheres comuns que, transtornados por uma enxurrada de notícias falsas, crimes inexistentes, conclamações pouco refletidas, feitas no calor da hora, e outras sandices, que se atirarão contra quem for marcado como politicamente incorreto ou indigno de compartilhar o admirável mundo novo que se alevanta no Brasil. Dessa maneira fica muito mais difícil conter os abusos como punir, posteriormente, os responsáveis, os mandantes desses crimes. Como diz aquele outro: “Não há provas que o tríplex é meu”.
__ Creio que às classes médias brasileiras só lhes resta ingressar em um dos inúmeros movimentos políticos que começam a manifestar-se pelo Brasil, para ganhar e ocupar as ruas, garantindo que nelas só vai vingar o que estiver na lei, lei esta feita sob a tutela da sociedade, antes que lhe invadam os apartamentos e lhes arranquem todos os dentes, sem ninguém sequer saber o porquê.        


Eis as profecias de Taís Araújo: “Mas meu filho é um menino negro e liberdade não é um direito que ele vai poder usufruir. Se ele andar pelas ruas, descalço, sem camisa, sujo, saindo da aula de futebol, ele corre o risco de ser apontado como um infrator, mesmo aos 6 anos de idade... Quando ele se tornar adolescente, ele não vai ter a liberdade de ir para sua escola, pegar uma condução, um ônibus, com sua mochila, com seu boné, seu capuz, com seu andar adolescente, sem correr o risco de levar uma investida violenta da polícia. Ao ser confundido com um bandido. No Brasil, a cor do meu filho é a cor que faz com que as pessoas mudem de calçada, escondam suas bolsas e blindem seus carros. A vida dele só não vai ser mais difícil que a da minha filha”. A África do Sul, do Apartheid, mudou-se para cá. Julgue o leitor...

domingo, 19 de novembro de 2017

O SOL NASCE NO ORIENTE

Eduardo Simões

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http://www.scmp.com

__ Ficamos mal-acostumados. Desde o início do século XVIII, quando a Inglaterra começou a montar, de forma obstinada e paulatina, o seu formidável Império, que o sol da política e da economia mundial nasciam no ocidente geográfico do planeta; entretanto, a recente visita de Donald Trump ao Oriente alinhou definitivamente o nascente político-econômico com o nascente geográfico. Bizarro, muito bizarro, o homem branco, grande e louro, defensor do uso indiscriminado de armas, do desprezo à respeitabilidade das mulheres, do egoísmo visceral e individualista, com fórmula de sucesso em seu país: “América First!”, que tornou isso possível, tão rápido.
__ Trump tratou com desprezo e grosseria a gentileza que o líder japonês fez ao convidá-lo para alimentar as carpas imperiais, um dos animais símbolos do Japão; o aloprado derramou o conteúdo da caixa de ração todo de uma vez, arriscando a matar os animais: as carpas comem até a morte. No Parlamento da Coreia do Sul fez um discurso cheio de ameaças ao Norte; na China falou mal de seu antecessor, agravando a divisão interna nos EUA; no Vietnã ameaçou todos os países presentes com o protecionismo americano, nas Filipinas ficou a ouvir uma melosa serenata noturna feita por um dos mais desequilibrados governantes do mundo, Rodrigo Duterte, enquanto o povo transformava as ruas da capital numa praça de guerra, por causa dele.
__ Não muito distante dali, três esquadrilhas de porta-aviões faziam manobras intimidatórias, trazendo de volta à memória local o tempo em que as divergências políticas eram resolvidas pela boca de um canhão naval, os ocidentais tratavam os orientais como “cachorros” e os orientais representavam os ocidentais como “demônios”. Foi isso o que sobrou depois que Trump torpedeou a iniciativa transpacífica de Obama, onde esses países seriam tratados como sócios, dentro da mais poderosa zona comercial do mundo. Hoje são as “pulgas”, como Coreia do Norte e Israel, que definem a política externa do colossal “buldogue” americano.
__ Os chineses devem estar exultantes, não é que eles esperavam que fosse tão fácil ganhar a hegemonia da política mundial, o que eles decerto não esperavam é que Trump fosse até lá deixar isso no colo deles. A recepção que deram a Trump foi apoteótica, bem diferente da forma desprezível como Trump recebeu Xi Jinping nos EUA, como se eles, os chineses, soubessem, e eles sabem muito bem, que nada deixa um homem vaidoso e superficial fora do eixo que uma saraiva de homenagens – os jornalistas brasileiros não entenderam nada; um deles, Jorge Pontual, chegou a dizer que, por “alguma razão” (!), os chineses “adoram” Trump, como se a sua recepção na China não tivesse sido cuidadosamente, milimetricamente, planejada pelos dirigentes locais. Essa gente, não passou os últimos cinco mil anos sentada à beira do caminho ou coçando o bicho do pé, não!
__ Com gestos estudados, serenos, voz tranquila, mas firme, o dragão chinês cantou música de paz e progresso futuro aos ouvidos já cansados do belicismo e do imediatismo estéril do líder menor, Jinping defendeu a globalização, a ampliação das parcerias comerciais. Enquanto Trump choramingava os supostos milhões de prejuízo que os outros países davam aos EUA em suas trocas comerciais a China derrama bilhões, e promete continuar derramando, nos cinco continentes estabelecendo parcerias estratégicas de longo prazo, sem a necessidade de dispendiosos porta-aviões. Só falta aos chineses aprender a contar a sua história e cantar a sua sociedade, acompanhando o curso do dinheiro ou como se dizia no tempo da Guerra do Vietnã: “ganhar corações e mentes”, investindo mais em marketing cultural. O campo está aberto, e vai continuar assim nos próximos dois anos.       

__ Suprema ironia, Trump é filho de uma abastada família de classe média americana, que sempre gozou do bom e do melhor que o capital pode dar, na maior metrópole do Ocidente, enquanto o líder chinês foi obrigado a amargar uma juventude pobre, habitando numa caverna nos confins da China, em virtude da perseguição movida contra o seu pai, um funcionário do PC, caído em desgraça, mas o que se viu nesse encontro foi o homem-de-sociedade americano levar uma surra de educação, civilização e sabedoria política do homem-da-caverna chinês.

http://www.indianfolk.com

QUANDO A SOMA DAS ASNEIRAS ECONÔMICAS DOS SOCIALISTAS ATINGIR O NÍVEL DO INTOLERÁVEL, CHAME UM LIBERAL PARA RESOLVER, MAS QUANDO FOR A SOMA DAS ASNEIRAS DOS LIBERAIS QUE ATINGIR O NÍVEL DO INTOLERÁVEL, ENTÃO CHAME UM KEYNESIANO PARA RESOLVER.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

FALÊNCIA JÁ!

Eduardo Simões

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http://desacato.info

__ Há uns vinte anos, num programa da Rádio Aparecida AM com a então futura secretária de educação de Aparecida, Maria Lucia Chad, apresentei meus temores quanto ao avanço da municipalização na educação, decorrente de absurda iniciativa de nossos ilustres congressistas, na atual LDB (eles tinham que estar por trás disso!), uma vez que nunca tivemos uma tradição municipalista forte, antes sempre fôramos, e ainda somos, muito dependentes do poder federal – basta perguntar a uma amostra de transeuntes quantos sabem o nome do Presidente da República e quantos sabem o do seu prefeito.
__ Meus temores se fizeram amplamente realidade, e ainda ontem escutei num jornal televisivo que um estudo da BBC inglesa constatou que a corrupção estava prejudicando fortemente o desempenho educacional do país, e que numa amostra de municípios cerca de 33% apresentavam indícios de desvio de verbas. Querem apostar como eles são, em sua maioria, os mais pobres, os que mais necessitam de redenção pela educação? As disparidades regionais, e até locais, deverão disparar... ainda mais. Compare-se isso à sabedoria finlandesa de iniciar a reforma, que levou seu país ao ápice da educação e do desenvolvimento, justo pelos municípios e regiões mais pobres!  
__ Aliás, quando votaram essa lei, muitos entre “eles” justificaram que o melhor combate à corrupção seria aquele feito pelo cidadão comum, em nível municipal. Estou tentando me conter... é muito descaramento, muito mal caratismo ou completa ignorância do que ocorre nesse país, supor semelhante coisa! Denunciar um prefeito ou secretário que esteja desviando verba é comprar uma briga seríssima com alguém que, invariavelmente, é mais rico e influente que você na sua cidade, que é seu vizinho, sabe onde você mora, conhece seus hábitos e os de sua família; esse “bandido” não é nem igual a você perante a lei: ele é superior, pois goza de foro privilegiado e geralmente se defende com os melhores advogados, enquanto que você, e boa parte dos munícipes, tem que fazer uso de defensor público ou de advogados inexperientes ou recém-formados, como nossos parcos salários permitem. E quanto ao Poder Judiciário? Dá-nos este algum alento? As grotescas variações de decisões de nossa corte mais alta mostra-nos que talvez seja preferível apelar para o “cara-ou-coroa”. Nem a vantagem de um calvário breve e barato a nossa “justiça” garante.

__ A situação da nossa educação básica periclita e piora muito a cada instante em que hesitamos em tomar medidas enérgicas e continuamos a fingir que nada está acontecendo. É PRECISO REVERTER A MUNICIPALIZAÇÃO JÁ!

terça-feira, 17 de outubro de 2017

COVARDIA À BRASILEIRA

Eduardo Simões

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http://oliveirajunior2.blogspot.com.br

__ O mal está feito! Nada menos de 50 foram os mortos e feridos na tragédia de Janaúba, a maioria crianças entre 3 e 4 anos, num dos maiores ataques a escola já acontecidos na história... do mundo – em Columbine, onde dois transtornados invadiram a escola com fuzis automáticos, foram 15 mortos e 24 feridos! Isso foi inesperados e pegou-nos a todos de surpresa? A resposta é um estrondoso “NÃO”.
__ Dia após dia os canais de televisão relatam episódios de agressões covardes e sangrentas contra professores e alunos, partindo principalmente deste e de agentes estranhos ao ambiente, sem que se tome qualquer atitude ou sequer se abra um debate sobre o que fazer para melhorar a segurança ou a resposta das escolas em caso de ataques semelhantes; e não se pode sequer alegar que não houve ataques com vítimas fatais.
__ Em 2003, o estudante, Edmar Aparecido Freitas, que sofria bullying por ser obeso, invadiu a EE Coronel Benedito Ortiz, em Taiúva, São Paulo, e efetuou 14 disparos contra alunos e professores que estavam no pátio da escola, ferindo a sete ou nove deles, se matando em seguida. Uma escola pequenina, numa cidadezinha desconhecida, pouco mais de 5 mil habitantes, e um reles filho de humildes agricultores. Quem dá bolas para isso?
__ Em 2004, um jovem, com fama de introvertido e se propondo a matar uma professora de quem não gostava, invade uma escola de informática, em Remanso, na Bahia, matando uma funcionária, ferindo outras três pessoas – antes já havia morto a um vizinho adolescente, que o provocara outro dia – até ser preso. Beneficiado pelo fato de ser menor na época, 17 anos, sequer sabemos o seu nome.
__ Em abril de 2011, aconteceu aquele que era, até agora, o mais espetaculoso ataque a escola já acontecido no Brasil: o massacre de Realengo, no Rio de Janeiro, na Escola Municipal Tasso da Silveira, quando o ex-aluno, Wellington Menezes de Oliveira, um tipo muito introvertido e excessivamente ligado à Internet, invadiu a escola e começou a atirar a esmo nos alunos, até ser detido e morto por sargento de uma patrulha da PM, que providencialmente passava no local, mas que ainda assim não impediu 13 mortos e 22 feridos. Duas coisas chamaram a atenção nesse ataque a Realengo: a atitude dos professores, correndo para se salvar, deixando seus alunos sob fogo, e a espalhafatosa reunião do Governador Sérgio Cabral e do Prefeito Eduardo Paes, na quadra de esportes da escola, procurando obter visibilidade com a tragédia, afinal todas as TVs do Brasil estavam focadas na tragédia. Para Cabral a coisa toda era muito simples: o atirador não passava de “psicopata, animal”. Mais que ele?   

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Por Shana Reis/ Governo do Estado do Rio de Janeiro - O governador e o prefeito do Rio de Janeiro falam sobre a tragédia em Realengo, CC BY 3.0 br, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=14830863

__ Já que tudo não passava de psicopatia e “animalidade” do agressor, não havia, e nem há, necessidade tomar medidas de segurança para as escolas públicas, que em geral custam caro, ou pelo menos mais do que os senhores ilustres políticos brasileiros estão dispostos a pagar, afinal essas escolas só acolhem “negros” e “pobres”, e, por conseguinte, nada foi feito para evitar casos futuros, sequer preparar os professores para que, em casos semelhantes, saibam o que fazer para proteger melhor os seus alunos, parecido com os treinamentos recorrentes que fazem os professores nas escolas americanas. Será que é por que os filhos de políticos e autoridades não costumam frequentar esse “tipo” de escola.
__ Para que ninguém fique duvidando se realmente alguma coisa mudou nesses 14 anos, quando o Ministro da Educação Mendonça Filho (no alto) esteve em Janaúba, após a chacina, disse que “o modo como aconteceu foi uma situação que mesmo se tendo o melhor, em termos de segurança, não é fácil prever”. Falou quase tudo para não dizer nada. Ou seja, foi mais uma fatalidade, ou como já vi alguns diretores dizer, quando questionados sobre alguma violência em sua escola ao longo desses anos: “foi um fato isolado”. É claro que o senhor Ministro está poupando o prefeito da cidade, Carlos Isaildon Mendes, que já afirmara ser a tragédia “imprevisível”, da enorme responsabilidade de deixar funcionar uma pré-escola em um prédio sem o alvará dos bombeiros, e sem um único... “extintor de incêndio”, afinal ele é membro do dileto partido aliado ao do Ministro, o PSDB - Mendonça é do DEM. Se alguém duvida que a escola ficará mais perigosa com a municipalização, depois de Realengo e Janaúba é melhor “por as barbas de molho”.
__ Por falar em município e na Prefeitura de Janaúba, corre na justiça um processo interminável contra um dos mais longevos prefeitos da cidade Ivonei Abade Brito, também do PSDB, acusado de fraudar concorrência, falsificar documentos e comandar uma quadrilha para grilagem de terras públicas. Por falar em Ivonei Abade, foi justamente no último ano de mandato deste prefeito, que o assassino das crianças começou a trabalhar na creche. Que ironia que o partido tão vinculado à destruição das escolas paulistas e brasileiras, por meio da imitação de modelos alienígenas mal costurados e de uma política obsessiva de “enxugamento de gastos”, esteja tão ligado a esse que é, até hoje, a maior, mais cruel e mais covarde chacina da educação brasileira!
__ Que fazer se estou inquieto e só? No início do ano que vem, por conta da municipalização, do enxugamento e do novo Ensino Médio, engendrado em São Paulo do PSDB, duas comunidades juvenis grandes, poderosas e mutuamente hostis de minha cidade, deverão ser reunidas, à força, numa única unidade escolar, antiga e imprópria para este uso, fazendo-nos temer mais um ou vários episódios horrorosos, entre os muitos que ocorrem diariamente nas nossas escolas, cuidadosamente varridos para debaixo do tapete, sob a etiqueta de “fato isolado”.

__ Quem valerá as nossas crianças e os nossos jovens?   

domingo, 1 de outubro de 2017

ADAM SMITH – LINHA DO TEMPO

Eduardo Simões

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Alunas da Kirkclady High School, a escola de Adam Smith, visitando a Escola de Enfermagem e Ciências da Saúde da Universidade de Dundee. Na época de Smith não havia esse tipo de frequência na escola...  

1729-1737: Smith entra para a Burgh School of Kirkcaldy, atual Kirkcaldy High School, uma das escolas mais prestigiosas da época, dirigida pelo professor David Miller, muito conceituado na Escócia e alhures.  Diz o biógrafo francês Albert Delatour, Adam Smith, sa vie, ses travaux et doctrine, sobre esse período:
Desde essa época ele se fez notar por sua memória prodigiosa, servida por uma autêntica paixão pela leitura, que o fazia consagrar desde já aos estudos os seus períodos de recreação, sem nunca se misturar aos seus colegas [sintoma de certa sociopatia, por razões óbvias, se considerarmos o seu histórico anterior e exclusivo de “filhinho da mamãe”]; por outro lado, a sua compleição delicada afastou-o dos exercícios violentos e o colocou numa situação de inferioridade permanente aos olhos de seus colegas. Ele passava o tempo a ler, observar e refletir. Também adquiriu o hábito muito acintoso de falar sozinho, e de ficar distraído, mesmo quando acompanhado, singularidades que só se agravaram com o passar dos anos, e que davam um aspecto por vezes bizarro à sua fisionomia. E, no entanto, seus companheiros “pegavam pouco no seu pé” [bullying], uma vez que ele se mostrava sempre bom, generoso e prestativo, de sorte que seus colegas lhe queriam bem e poupavam-no de suas brincadeiras e sarcasmos, próprios desse período e à rude disciplina das escolas da época” (tradução livre).
Dessa excentricidade de Smith sobraram alguns relatos simplesmente memoráveis, descritos por R. L. Heibroner, Introdução à história das ideias econômicas. Um vez, já famoso, seguia na companhia de um amigo, em uma franca conversação quando uma sentinela de um prédio público, em frente, desceu uma escadaria, o cumprimentou e deu meia volta; para surpresa do interlocutor Smith seguiu o soldado marchando logo atrás, ao chegar no cimo da escadaria brandiu a bengala como se fosse uma espada, desceu a escadaria e retomou a conversa de onde havia parado; suas roupas eram despropositadamente coloridas.
Na Wikipedia, em inglês, lê-se: “Era acometido de feitiços ocasionais e doenças imaginárias. Guardavas seus livros e papeis em altas pilhas no seu escritório [ao invés de usar estantes]. Conforme uma história, ele levou o importante político inglês Charles Towshend [1725-1767] a um curtume fabril, para lhe mostrar as vantagens do livre-comércio, quando no meio de uma exposição caiu dentro de um tonel de tanino [que ficava rés ao chão], sendo necessária a ajuda dos empregados para retirá-lo de lá Certa vez ele pôs, sem perceber, pão e manteiga dentro de um bule de chá, e depois disse que aquele fora o pior chá que ele já tomara. Certa vez ele saiu só de camisola de sua casa, e caminhou distraído, conversando consigo mesmo, até várias milhas fora da cidade, quando o sino de uma igreja o despertou para a realidade... [era dominado por temores fúteis], James Boswell [1740-1795], seu aluno na Universidade de Glasgow... disse que ele evitava falar de suas ideias em público com receio que diminuísse a venda de seus livros, e por isso era uma companhia muito desinteressante... Ele teria dito: “não vejo nenhuma beleza em mim, exceto em meus livros” (tradução livre). Usava roupas coloridas, bem chamativas, e recusava-se invariavelmente a posar para retratos, por isso são poucas as imagens que sobraram dele, a maioria feita de memória pelos artistas.

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...E talvez por isso ele tenha ficado esquisitão!

domingo, 24 de setembro de 2017

A DAMA DO IRAJÁ (1)

Eduardo Simões

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__ Nunca escondi a admiração que sentia pela doutora Janaína Paschoal, em todo o processo que levou ao “semi-impedimento” de Dilma Rousseff, uma jabuticaba brasileira. Sua coragem e a sua determinação eram louváveis, embora, por vezes, eu achasse que ela se excedia na exposição de seus motivos; prefiro uma abordagem mais técnica, mais serena, mas isso pode ser atribuído a uma característica de temperamento, que em nada desabona um caráter.
__ A coisa, porém, mudou, quando ela teve o desplante ou... não sei o que dizer, de escrever uma mensagem de apoio às iniciativas de um personagem claramente falto de juízo ou aloprado o suficiente, para numa sessão de uma loja maçônica, defender a possibilidade de o exército vir a tomar a iniciativa de um novo golpe a pretexto de defender a Constituição: o General Antonio Hamilton Martins Mourão. Não é difícil falar em repúdio dessa aberração, assim como não é difícil entender a posição indefensável do Ministro da Defesa, gravemente desmoralizado nesse episódio – aliás, ele já se autodesmoralizou bastante, quando recusou-se a seguir o seu partido e abandonar ao corrupto Governo Temer.
__ Para aqueles que têm memória curta ou não conhecem a história de seu país, é bom saber que os militares, em 1964, deram um golpe no presidente eleito justamente com esse pretexto: “salvar a democracia brasileira (prevista na Constituição) do avanço do comunismo totalitário, e o país do caos econômico”, e o resultado foram vinte anos, com muito menos democracia do que havia antes de 64 e um descalabro econômico como nunca antes na historia do Brasil, inclusive no episódio do famoso encilhamento: a dívida externa subiu de US$4 bilhões para US$102 bilhões; em 1983 o país estava insolvente e o FMI começou a mandar seus fiscais para monitorar o país; a inflação de 1963, a última do Governo Goulart, foi de 79,9%, mas a inflação do último ano do governo Figueiredo foi de 211%. Depois de tudo isso será que ainda há quem queira repetir essa história? Já não nos basta de tragédias?
__ Quem garante que essa desordem, essa desmoralização política, não é fruto justamente da longa permanência dos militares no poder, e o Estado artificial que criaram, e que impediu a renovação natural das forças políticas do país, de sorte que, quando houve a redemocratização, foram os velhos caciques, pré-64, já completamente desatualizados, com um discurso surrado dos anos 60, que dominaram a cena política? A destruição da família brasileira não foi também o preço que pagamos pelos militares terem proibido o debate político interno, principalmente quando explodiam os grandes escândalos, e els mandaram entupir os jovens de pornografia de baixa qualidade, nas pornochanchadas da EMBRAFILME, que lotavam a cabeça da juventude de sordidezes de toda espécie, que ajudaram a destruir os valores familiares e o respeito pelas mulheres, que tanto os militares de 64, quanto os de hoje, alegam querer proteger como justificativa para o golpe?  
__ Quem tem que defender a Constituição é o cidadão consciente, não se deixando arrastar por esse canto de sereia tão rouco, démodé e indigno de confiança, sequer de atenção, que insiste em nos fazer crer menores, incapazes, e por isso precisados de um ou vários “salvadores da pátria”, que sempre deixam a pátria pior do que encontraram, embora eles mesmo obtenham para si muitas vantagens. Igualmente responsáveis por essa democracia, de uma maneira muito especial, são aqueles cuja vocação, acreditamos, os arrastou para as lides do direito, para o território do Poder Judiciário, o último e mais insigne guardião da Constituição e da democracia, absurdamente tripudiado pela declaração infeliz de Janaína Paschoal e a loucura do General.
__ Mas, tudo bem! Se não podemos, nós os liberais, amantes da democracia e de uma ordem jurídica baseada na força do direito, e não da força bruta, militarizada, de quem não a tem, mas antes a usurpa do povo para, mais cedo ou mais tarde, apesar do discurso enganador, o canto da sereia, jogá-la contra o próprio povo, embora sem poder mais contar com a presença combativa de Janaína Paschoal, nem por isso devemos deixar de lutar com todas as nossas forças contra qualquer tentativa de esbulho do sagrado direito de qualquer cidadão de optar pelo político e pela ideologia que lhe parecer melhor, ainda que seja um erro, pelo qual todos devem pagar para podermos amadurecer, enquanto nação, e não ficarmos a pedir ajuda ou solução dos militares, que não estão preparados para isso, já o provaram sobejamente, como se fôssemos crianças, que toda vez que fazem uma “arte” acorrem para se esconder debaixo da saia ou as calças verde-oliva da “mamãe” ou do “papai”...
__ Estamos novamente, como em 64, num período de transição, de afirmação do regime democrático, uma plantinha tenra, recém-plantada no jardim de nossa evolução política visceralmente autoritária, capaz de gerar pérolas como a daquele general-presidente: “Juro que hei de fazer desse país uma democracia; e quem disser o contrário eu prendo e arrebento”, e é normal que ocorram esses percalços, precisamos ter paciência e agir com firmeza sempre que quiserem, seja quem for, atropelar a marcha das instituições legais, que já avançaram como nunca na nossa história no combate à corrupção, sob pena de termos que abdicar de vez da esperança de um dia formarmos uma nação digna de respeito...

(1) Para as gerações atuais, houve na época da ditadura uma peça teatral humorística chamada “Greta Garbo, quem diria, acabou no Irajá”, que conta a história de um travesti sonhador, que viva com a cabeça na Broadway, tanto é que escolheu o nome de uma das maiores atrizes do cinema para ser seu “nome de guerra”, sonhado com altos espetáculos e muito sucesso, desligada da realidade, até que um dia deu por si, estava madura e decadente, protagonizando espetáculos mambembes, num dos subúrbios mais pobres do Rio de Janeiro. É onde a maioria pessoas, em geral, sepulta seus mais belos sonhos de adolescência... O termo “Irajá”, tirante o bairro de verdade, que tem gente muito boa, acabou com o significado de “fracasso repentino, virada surpreendente, de alguém de quem se espera muito”...