O
SOL NASCE NO ORIENTE
Eduardo
Simões
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Ficamos mal-acostumados. Desde o início do século XVIII, quando a Inglaterra
começou a montar, de forma obstinada e paulatina, o seu formidável Império, que
o sol da política e da economia mundial nasciam no ocidente geográfico do
planeta; entretanto, a recente visita de Donald Trump ao Oriente alinhou
definitivamente o nascente político-econômico com o nascente geográfico. Bizarro,
muito bizarro, o homem branco, grande e louro, defensor do uso indiscriminado
de armas, do desprezo à respeitabilidade das mulheres, do egoísmo visceral e
individualista, com fórmula de sucesso em seu país: “América First!”, que
tornou isso possível, tão rápido.
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Trump tratou com desprezo e grosseria a gentileza que o líder japonês fez ao convidá-lo
para alimentar as carpas imperiais, um dos animais símbolos do Japão; o
aloprado derramou o conteúdo da caixa de ração todo de uma vez, arriscando a
matar os animais: as carpas comem até a morte. No Parlamento da Coreia do Sul
fez um discurso cheio de ameaças ao Norte; na China falou mal de seu
antecessor, agravando a divisão interna nos EUA; no Vietnã ameaçou todos os
países presentes com o protecionismo americano, nas Filipinas ficou a ouvir uma
melosa serenata noturna feita por um dos mais desequilibrados governantes do
mundo, Rodrigo Duterte, enquanto o povo transformava as ruas da capital numa
praça de guerra, por causa dele.
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Não muito distante dali, três esquadrilhas de porta-aviões faziam manobras
intimidatórias, trazendo de volta à memória local o tempo em que as
divergências políticas eram resolvidas pela boca de um canhão naval, os
ocidentais tratavam os orientais como “cachorros” e os orientais representavam
os ocidentais como “demônios”. Foi isso o que sobrou depois que Trump torpedeou
a iniciativa transpacífica de Obama, onde esses países seriam tratados como
sócios, dentro da mais poderosa zona comercial do mundo. Hoje são as “pulgas”,
como Coreia do Norte e Israel, que definem a política externa do colossal
“buldogue” americano.
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Os chineses devem estar exultantes, não é que eles esperavam que fosse tão
fácil ganhar a hegemonia da política mundial, o que eles decerto não esperavam é
que Trump fosse até lá deixar isso no colo deles. A recepção que deram a Trump
foi apoteótica, bem diferente da forma desprezível como Trump recebeu Xi
Jinping nos EUA, como se eles, os chineses, soubessem, e eles sabem muito bem,
que nada deixa um homem vaidoso e superficial fora do eixo que uma saraiva de
homenagens – os jornalistas brasileiros não entenderam nada; um deles, Jorge
Pontual, chegou a dizer que, por “alguma razão” (!), os chineses “adoram”
Trump, como se a sua recepção na China não tivesse sido cuidadosamente,
milimetricamente, planejada pelos dirigentes locais. Essa gente, não passou os
últimos cinco mil anos sentada à beira do caminho ou coçando o bicho do pé,
não!
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Com gestos estudados, serenos, voz tranquila, mas firme, o dragão chinês cantou
música de paz e progresso futuro aos ouvidos já cansados do belicismo e do
imediatismo estéril do líder menor, Jinping defendeu a globalização, a ampliação
das parcerias comerciais. Enquanto Trump choramingava os supostos milhões de
prejuízo que os outros países davam aos EUA em suas trocas comerciais a China
derrama bilhões, e promete continuar derramando, nos cinco continentes
estabelecendo parcerias estratégicas de longo prazo, sem a necessidade de
dispendiosos porta-aviões. Só falta aos chineses aprender a contar a sua
história e cantar a sua sociedade, acompanhando o curso do dinheiro ou como se
dizia no tempo da Guerra do Vietnã: “ganhar corações e mentes”, investindo mais
em marketing cultural. O campo está aberto, e vai continuar assim nos próximos
dois anos.
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Suprema ironia, Trump é filho de uma abastada família de classe média
americana, que sempre gozou do bom e do melhor que o capital pode dar, na maior
metrópole do Ocidente, enquanto o líder chinês foi obrigado a amargar uma
juventude pobre, habitando numa caverna nos confins da China, em virtude da
perseguição movida contra o seu pai, um funcionário do PC, caído em desgraça,
mas o que se viu nesse encontro foi o homem-de-sociedade americano levar uma
surra de educação, civilização e sabedoria política do homem-da-caverna chinês.
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