domingo, 19 de novembro de 2017

O SOL NASCE NO ORIENTE

Eduardo Simões

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__ Ficamos mal-acostumados. Desde o início do século XVIII, quando a Inglaterra começou a montar, de forma obstinada e paulatina, o seu formidável Império, que o sol da política e da economia mundial nasciam no ocidente geográfico do planeta; entretanto, a recente visita de Donald Trump ao Oriente alinhou definitivamente o nascente político-econômico com o nascente geográfico. Bizarro, muito bizarro, o homem branco, grande e louro, defensor do uso indiscriminado de armas, do desprezo à respeitabilidade das mulheres, do egoísmo visceral e individualista, com fórmula de sucesso em seu país: “América First!”, que tornou isso possível, tão rápido.
__ Trump tratou com desprezo e grosseria a gentileza que o líder japonês fez ao convidá-lo para alimentar as carpas imperiais, um dos animais símbolos do Japão; o aloprado derramou o conteúdo da caixa de ração todo de uma vez, arriscando a matar os animais: as carpas comem até a morte. No Parlamento da Coreia do Sul fez um discurso cheio de ameaças ao Norte; na China falou mal de seu antecessor, agravando a divisão interna nos EUA; no Vietnã ameaçou todos os países presentes com o protecionismo americano, nas Filipinas ficou a ouvir uma melosa serenata noturna feita por um dos mais desequilibrados governantes do mundo, Rodrigo Duterte, enquanto o povo transformava as ruas da capital numa praça de guerra, por causa dele.
__ Não muito distante dali, três esquadrilhas de porta-aviões faziam manobras intimidatórias, trazendo de volta à memória local o tempo em que as divergências políticas eram resolvidas pela boca de um canhão naval, os ocidentais tratavam os orientais como “cachorros” e os orientais representavam os ocidentais como “demônios”. Foi isso o que sobrou depois que Trump torpedeou a iniciativa transpacífica de Obama, onde esses países seriam tratados como sócios, dentro da mais poderosa zona comercial do mundo. Hoje são as “pulgas”, como Coreia do Norte e Israel, que definem a política externa do colossal “buldogue” americano.
__ Os chineses devem estar exultantes, não é que eles esperavam que fosse tão fácil ganhar a hegemonia da política mundial, o que eles decerto não esperavam é que Trump fosse até lá deixar isso no colo deles. A recepção que deram a Trump foi apoteótica, bem diferente da forma desprezível como Trump recebeu Xi Jinping nos EUA, como se eles, os chineses, soubessem, e eles sabem muito bem, que nada deixa um homem vaidoso e superficial fora do eixo que uma saraiva de homenagens – os jornalistas brasileiros não entenderam nada; um deles, Jorge Pontual, chegou a dizer que, por “alguma razão” (!), os chineses “adoram” Trump, como se a sua recepção na China não tivesse sido cuidadosamente, milimetricamente, planejada pelos dirigentes locais. Essa gente, não passou os últimos cinco mil anos sentada à beira do caminho ou coçando o bicho do pé, não!
__ Com gestos estudados, serenos, voz tranquila, mas firme, o dragão chinês cantou música de paz e progresso futuro aos ouvidos já cansados do belicismo e do imediatismo estéril do líder menor, Jinping defendeu a globalização, a ampliação das parcerias comerciais. Enquanto Trump choramingava os supostos milhões de prejuízo que os outros países davam aos EUA em suas trocas comerciais a China derrama bilhões, e promete continuar derramando, nos cinco continentes estabelecendo parcerias estratégicas de longo prazo, sem a necessidade de dispendiosos porta-aviões. Só falta aos chineses aprender a contar a sua história e cantar a sua sociedade, acompanhando o curso do dinheiro ou como se dizia no tempo da Guerra do Vietnã: “ganhar corações e mentes”, investindo mais em marketing cultural. O campo está aberto, e vai continuar assim nos próximos dois anos.       

__ Suprema ironia, Trump é filho de uma abastada família de classe média americana, que sempre gozou do bom e do melhor que o capital pode dar, na maior metrópole do Ocidente, enquanto o líder chinês foi obrigado a amargar uma juventude pobre, habitando numa caverna nos confins da China, em virtude da perseguição movida contra o seu pai, um funcionário do PC, caído em desgraça, mas o que se viu nesse encontro foi o homem-de-sociedade americano levar uma surra de educação, civilização e sabedoria política do homem-da-caverna chinês.

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